a negra noite
a Kátia Benghi e família
quando não escrevo
fico inseguro
escuro parece
o mundo
e eu me afundo nos vales piscicotrópicos
da mente
à base de muito
naramig
espanco a dor
afasto o horror
das atividades diurnas (prefiro as noturnas
a encher de poemas
a parede rabiscada
por tintas obscenas) o horror das atividades
diurnas a construir castelos
de sonhos na mente do indigente
percorrendo a avenida
manoel ribas
com os cães em matilha
sorridentes com fome de três dias
talvez seja somente utopia
mas madrugada adentro
é de rasgar o olho
a quantidade
de serotonina
de nora-drenalina
a desmoronar
por tediosas veias
invadindo a negritude do céu
com versos brancos
contrabandeando palavras
entre o leste e o oeste
da estrada negra
do vale do iguaçú
estou na noite negra
entorpecido
como se estivesse a morer
estou na noite negra
inaugurando um novo caderno de alegoria
poesia e confete
estou na noite negra
declamando aos mortos
estou na noite negra
vestido de azul
mastigando mel que vem do sul
estou na noite negra
mais calmo mais oculto
escondido e sem pânico
a desafiar os dentes
estou na noite negra
defendendo os doentes
que se entregam tristes nos hospitais pisciquiátricos
estou na noite negra
fumando
fumando e fumando
um marlboro
um lucky strike
um choro
uma nova arte
à moda antiga
de canivete em pulso
pulso que pulsa o pulsar
nervoso da sílaba riscada no chão da mímica
ao mesmo tempo fome e comida
estou na noite negra
nos braços carrego o violão
nas costas desaba o cabelo negro e longo
como esta noite negra