avenida bento munhoz da rocha neto
estou ainda grudado
emparedado
amordaçado
na avenida bento munhoz da rocha neto
minha cabeça está galopando
eu continuo acreditando mesmo vendo
a passagem dos carros apressados
em seus movimentos retalhados
no mármore da calçada
eles querem alguma coisa
uma coisa a mais
passa um cachorro bêbado
bêbado de fome
bêbado de amor
bêbado de tristesa
ele olha para mim e abana o rabo
com a certeza
que sou bom
sou bom para com os cães
meu cachorro morreu
não sei se foi por deus
não acredito
(na certeza de deus)
deus não existe
deus esta morto
foi o que nietsche falava
e sartre confirmava
os deuses do olimpo da grécia
devem estar mais vivos do que eu
não sei...
um carro passou...
acelerando acelerando demais
um porsche 911 vermelho
agora vem uma pampa antiga
agora passam dois caminhões
três caminhões
mais um ônibus da prefeitura municipal de porto
vitória
atravessando a cruz de malta
esse cruzamento endiabrado como pétala sanguínea
feito de loucos ajoelhados
feito de loucos calados
passa a polícia por mim
eles desconfiam do meu cabelo
eles desconfiam de minha presença
eles desconfiam de minha crença
da minha palavra
da minha lavra
fortuna de lágrimas
fortuna de lástimas
fortuna de horrores
fortuna de esperanças
fortuna de crianças
belas e singelas
curtindo o sol de amarelas flores
flores pelo canteiro da cidade
onde pintam e bordam
à bordo de uma centena de milhares de carros insones
cruzando a noite e a madrugada também
eu também
(durmo somente depois das quatro)
eu també sei
(o que é o almorecer tímido no lapidar da mesa)
eu coloco agora meu pé sobre a mesa
mesa-teresa
não estou me preocupando com o que dizem
nem com o que pensam
estou somente sentado numa cadeira amarela
de fronte a barulhenta
avenida bento munhoz da rocha neto