Ribamar Bernardes

dor amarela

dor amarela

 

 

olho tua foto retorcida num papel amarelo

lá fora brilha um sol contente e também amarelo

minhas lágrimas não  minha lágrima é prata  

um prata celeste

prata de dia nublado e triste

dia das dores imaculadas

que atingem as pessoas caladas de nossa insana

cidade

e não há maldade no que eu digo através de minha

boca sacrossanta (sou ser repleto de nostalgia)

molho o cobertor ao ver tua foto

nosso amor era sério

as árvores se curvavam em reverência

a deusa e a eloquência falava por nós

as vezes nossos silêncios duravam séculos

era um silêncio bom

de quem já disse tudo

esta satisfeito

não há jeito

em toda a relação há um bom defeito

o sangue jorra de alguma ferida mal curada

e o que sobra é o nada

do nada fizemos jaula de proteção

fugimos da aula e enganamos o cão

passamos a desviar o olhar desesperado um do outro

e o que resta é a promessa de cumprirmos a

promessa

assim as flores de minha floresta ficam tristes

o vento canta a cantiga melancólica

a natureza inteira torna-se bucólica

os colibris beijam as donzelas com desconfiança

e a tarde gris

olha com olhos de ressaca

toda essa dança

embalada por sono de criança

inebriada pelos vapores cálidos do útero da terra

vai  em desespero ao encontro do seu erro

vai  poeta

eu não vou  prefiro minhas paredes amarelas

minhas musas poéticas

aqui tenho tudo posso chorar a vontade

minha eterna calamidade

minha eterna falta de vontade

sou tímido e fraco

como o sol das seis