girassol russo
a gustavo moeck pinto cordeiro
sergei iessiênin
morreu aos trinta anos
com sangue nas mãos e fama de suicída
pois liquidou a vida
muito antes
em dias de boemia
(aliada à nostalgia dos dias ensolarados do
império russo)
melhor morrer de vódka do que de tédio
disse seu amigo
maiakovski
braço amigo
a segurar a pena
a servir de abrigo
para o poeta
com fios de sangue que corre pelos pulsos
esculpindo seu derradeiro poema
talvez o primeiro de verdade
na verdade crua
já que foi literalmente o último
mas há
um quê
de primário
de primeiro olhar
de olhar distraido
finalmente um olhar que não nos deixa cançado
esse era o olhar de suicída de sergei
no esplendor de mil novecentos e vinte e cinco
aniquilando o vazio da vida com poema cheio de brio
assim deve ser o poeta
não deve cair
mas não deve ficar parado
deve andar
à beira do precipício
nunca confiar no dece armistício
a guerra não cessa
sua imaculada máquina cresce
no simples arranhar de duas mãos
o poeta não lapida pedra alguma
ele espanca a pedra
vê sangue
faz verso
como sergei
poeta futurista
em meio à revolução comunista
em meio às bombas de oxigênio
e meio ao delírio das mãos descarnadas
em meio assombro diante da granada
estilhaçando os ossos
e tudo era poesia
no emaranhado da mente do apavorado e novo poeta
deve estar a sábia
confissão de ser confuso
de parecer estar no planeta errado
como girassol brilhante
no vácuo do lixo nauseabundo
tudo é poesia
a vida de segei é poesia
o suicídio de sergei é poesia
o abraço longo de maiakovski é poesia
o girassol amarelo dançando ao vento enterrado no
lixo
é poesia
nada sacia o poeta enfurecido pelo deus do tormento
sua palavra é a certeza
que sua lavra não foi
em vão