Ribamar Bernardes

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súbito impulso

súbito impulso

 

 

me aproprio dos antigos remotos anfíbios

mestres (estou com frio e estou prestes a cometer desvario)

como atirar-se lentamente no meio do rio

foram mestres

ou doutores da lei literária

morta e caduca

que me colocaram a faca na nuca

somente pânico jorra dos livros que leio

creio que nossa vida anda meio esquecida

por um deus que nunca disse a que veio

será crise cristã aos trinta e três?

continuo sem saber em que mês dia ano solar ou lunar

estou

e o resto de mim

voôu

para o deserto cômico da colina

onde as gralhas desfilam risadas mórbidas

a invadir minha rima

invadir meu último centavo de agonia

matéria prima de minha poesia

a invadir os jornais de segunda

com suas mortes endiabradas

manchando de sangue meus poemas

jogados pela calçada

a invadir meu teto enlameado

pelo pus sagrado

brotando de meus pulsos cortados

é preciso mais ironia

é preciso acabar com essa gritaria

é preciso mais sarcasmo

é preciso espantar o marasmo

dos nossos domingos sossegados

regados a maionese e costela

matamos bois e galinhas

não devemos nos sentir culpados

é simples apropriação

do que é seu não por direito oblícuo

mas por guerra mútua

assim encaro marx rimbaud vinicios bukowski 

não sei mais quem

encaro e escarro

nestas faces carcomidas pelas paredes

angustiadas em que viveram

estão mortos

ocioso pasto para vacas sonolentas

belos bustos nas praças violentas

leituras vazias em salas de aula também vazias

tudo isso me dá azia

tomo um sonrisal

e vou dormir